segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Os Quadrados de Oposição Deônticos

O quadro abaixo mostra relações lógicas entre os conceitos de obrigatório, proibido e permitido quando aplicados a uma expressão que indica conduta. Que tipo de expressões da linguagem são usados para indicar conduta é uma questão que deixamos por enquanto em aberto. Notamos, todavia, que as proposições não são em geral uma boa escolha para ocupar a posição de expressão que designa conduta, pois por meio delas estabelecemos relações (ou propriedades) entre sujeitos. Exemplos de proposições são: Paulo é bonito; Paulo é mais alto que Pedro; A casa do João fica entre as avenidas Getúlio Vargas e Praia de Belas. Em nenhum dos exemplos dados descevem-se condutas.


Quando precisamos descever condutas usamos com frequência o verbo no infinitivo. Assim fumar é uma expressão empregada para descrever conduta, não uma conduta específica de alguém como em fumar-Pedro, mas uma conduta geral como fumar-quem-quer-que-seja. Desse modo a expressão Proibido(fumar) é um exemplo do que estamos referindo por modalização de uma conduta. Há duas possibilidades com respeito a interpretação da expressão anterior. Ela pode ser entendida como uma proposição e nesse caso ela pode ser refraseada como fumar é proibido. Todavia, esta não é a forma mais comum pela qual refrasearíamos a expressão, a forma mais comum seria é proibido fumar. Essa última expressão por sua vez permite dois usos um pouco distintos: o uso para afirmar como em é proibido fumar em prédios públicos segundo a legislação brasileira (.); o uso para expressar uma ordem como em é proibido fumar na minha sala (!).
O quadro abaixo difere do anterior, pois nele a obrigatoriedade, a proibição e a permissão são conceitos aplicados às proposições. Ainda que tais conceitos caibam de modo mais adequado sobre expressões designando conduta, há uma possibilidade sob a qual essas modalidades podem aplicar-se às proposições. Referimo-nos à situação em que as modalidades descrevem a idealidade daquilo contido na proposição, ou ainda, a desejabilidade da realização do conteúdo da proposição, mas desejabilidade em um sentido o mais objetivo possível, independente de um sujeito que deseja:



Existe uma discussão ampla acerca de qual seria a lógica deôntica adequada para representar as leis lógicas deônticas. Deve-se subentender (nesse segundo caso) que a aplicação de uma modalidade deôntica sobre uma proposição resulta uma proposição. A lógica deôntica entendida sob essa perspectiva permitiria o uso da ferramenta semântica-de-mundos-possíveis para o esclarecimento do que significa dizer que uma proposição deôntica é verdadeira ou falsa. Contudo é preciso manter em mente que a forma de interpretar uma proposição deôntica segundo esse sentido é o de que a verdade (ou falsidade) da proposição modalizada está sendo tomada como obrigatória, proibida ou permitida. A própria verdade (ou falsidade) da proposição deôntica dependerá de como tratamos da verdade da proposição modalizada. Ou seja, uma proposição deôntica como Obrigatório(p) deve ser lida como é obrigatório que p seja o caso. Assim, Obrigatório(Pedro é mais alto que Paulo) deve ser lida é obrigatório que Pedro é mais alto que Paulo seja o caso. Dito em português mais adequado: é obrigatório que Pedro seja mais alto que Paulo. Veja que essa sentença não pode ser reformulada como Pedro é mais alto que Paulo é obrigatório, pois teríamos dois verbos no indicativo dentro da mesma oração, quando um deles deveria estra subordinado. Na melhor das hipóteses poderia ser reformulada como Que Pedro seja mais alto que Paulo é obrigatório.

domingo, 3 de outubro de 2010

Textos sobre Norma e sua Interpretação

Abaixo damos os links para dois textos.

No primeiro encontramos uma discussão da natureza das normas ou prescrições e como os conceitos modais de obrigação, permissão e proibição podem estar relacionados a ela. Embora o autor admita que o dever-ser seja um tipo de estrutura proposicional relevante, sua opinião é a de que prela sua própria natureza as prescrições e normas deveriam ser compreendidas sob a estrutura dever-fazer.

Texto de H.N. Castaneda sobre a diferença Ought-to-do e Ought-to-be

No texto de Bulygin encontramos a discussão de um tema próprio ao direito em que o autor faz apelo a uma série de distinções relacionadas a estrutura sistêmica das normas. É sobretudo essa exposição que mais nos interessa aqui.

Texto Sobre a Regra de Reconhecimento Bulygin

Lógica e Argumentação - Sistemas

A lógica contemporânea pode ser enxergada desde duas perspectivas distintas. Ou olhamos para ela do ponto de vista sistêmico, ou seja, aquele no qual as regras lógicas são parte constituinte de um sistema axiomático; ou olhamos para a lógica desde o ponto de vista da captura de estruturas argumentativas. A lógica contemporânea é sobretudo lógica matemática. O sentido principal sob o qual ela é matemática é o de que a lógica contemporânea trata do discurso matemático, em particular, do discurso de provas matemáticas. Claro, as provas estabelecem teoremas e o ponto de partida dessas provas são os axiomas de uma teoria. Olhando para as provas da geometria ecuclidiana, esse grande monumento histórico intelectual, elas são nada mais do que certas argumentações construídas segundo certos moldes gerais, canônicos. Assim, na lógica contemporânea os dois aspectos estão firmemente unidos (guardando a tradição venerável da geometria) e podem ser descritos como nada mais do que duas perspectivas distintas, embora a perspectiva sistêmica seja mais recente e também aquela que tenha dado maior impulso ao desenvolvimento da lógica no século XX.

Essas duas perspectivas serão novamente encontradas quando se trata examinar a atividade jurídica de produção de normas. Abordar a lógica do direito é atividade que também pode ser desenvolvida segundo qualquer uma das duas pespectivas: a argumental e a sistêmica. Infelizmente, no caso do direito, (ainda) não é possível trazer as duas perspectivas unidas do mesmo modo que a encontramos na geometria euclidiana ou nas teorias matemáticas. Na verdade, há ainda uma série de estudos de natureza metodológica, com os respectivos debates envolvendo diferentes abordagens acerca do tema (em geral caracterizados como problemas de filosofia do direito), mas que ainda não nos permitem obter um resultado tão cristalino e claro como aquele que temos no caso da lógica matemática. Não que na matemática também não existam debates metodológicos, mas há pelo menos um consenso mais amplo acerca dos temas dos quais trata a lógica.

Um dos momentos metodológicos mais importantes no exame do direito está sem dúvida nas teorias de Kelsen e no juspositivismo de modo geral. Embora desde a perspectiva desse autor vários ganhos para o desenvolvimento de uma lógica do direito possam se citados, infelizmente, a perspectiva não se coaduna facilmente com uma perspectiva sistêmica. Se por um lado a teorização kelseniana é extremamente sensível a várias idiossincrasias da prática do direito, por outro lado metodologicamente ela parece ser muito restritiva.

Nas próximas aulas faremos um esforço em mostrar que uma certa perspectiva metodológica distinta daquela de Kelsen (mas que lhe toma de empréstimo alguns constructos) pode oferecer uma base para a formulação de uma perspectiva lógico-sistêmica do direito. Essa perspectiva envolve vários aquisicões de diferentes âmbitos da cultura humana, envolve discussões ao nível ontológico, de filosofia da linguagem, filosofia do direito, etc. Estaremos contentes em indicar um quadro geral para este âmbito, mencionando algumas idéias de Von Wright, de Bulygin e Alchourron, de Castaneda, etc. Aproveitaremos, sempre que possível, os momentos que se apresentarão para traçar alguns paralelos com a teoria metodológica de Kelsen acerca do direito.